04 novembro 2005



Oposição volta a falar em impeachment


Tecnicamente, se comprovada a denúncia de caixa 2, Lula será processado e pode perder o mandato, analisam parlamentares
Ricardo Callado
Não se trata de golpismo ou de precipitação: a situação de Lula configura um caso típico de impeachment, já que o presidente sabia e calou-se sobre um caso de corrupção: o caixa 2. Essa é a conclusão de especialistas em direito constitucional e parlamentares. O prefeito do Rio de Janeiro, César Maia (PFL) demonstrou coragem, além de domínio de direito constitucional, e foi o primeiro a falar abertamento sobre o caso. Na imprensa, o Jornal da Comunidade já abordou o tema em entrevista com o ex-presidente do Supremo Tribunal Federal, Maurício Corrêa, mostrando os caminhos para o impeachment.Mesmo que Lula não sofra o impeachment legal e seja expulso da Presidência já, acabou-se toda e qualquer chance de reeleição em 2006. Lula já é um ex-presidente, mesmo que continue no poder depois da CPI, pois sua imagem e prestígio sofreram duro golpe. A análise é do líder do PFL no Senado, José Agripino (RN), que vai propor à Comissão Executiva do partido que a legenda entre com uma representação contra o presidente Lula no Ministério Público por uso de caixa 2 na campanha de 2002. Agripino acredita que as declarações do presidente do PL, ex-deputado Valdemar da Costa Neto, e do ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares na acareação na CPI do Mensalão na quinta (27) são suficientes para embasar o pedido para que o presidente seja investigado. Ainda durante a acareação, o deputado Moroni Torgan (PFL-CE) já havia dito que a informação de que a campanha de Lula usou caixa 2 pode sustentar um pedido de impeachment do presidente. “Os três (Marcos Valério, Costa Neto e Delúbio) dizem que mandaram dinheiro para pagar contas de campanha do presidente. Se fosse um deputado, haveria a representação no Conselho de Ética contra ele. Caixa 2 vale para (cassar) deputado, mas não vale para (impeachment do) presidente?”, indagou Torgan. “Deputados nós punimos, e o presidente, vamos passar a mão na cabeça?”, acrescentou. Depois de o PFL cobrar do Congresso o debate sobre o impeachment do presidente Lula, dado que há elementos a indicar que a campanha dele foi feita com dinheiro ilegal do valerioduto, também os tucanos passaram a se manifestar sobre o caso, numa clara demonstração de que as relações entre a oposição e o governo estão se deteriorando rapidamente. A deputada Zulaiê Cobra (PSDB-SP), durante a acareação de tesoureiros partidários e políticos na CPI do Mensalão, endossou a afirmação do deputado Moroni Torgan de que, em face de declarações dos acareados, cabe representação contra o presidente. E o senador Antero Paes de Barros (MT) sugeriu que o PSDB entre com representação para que a Câmara abra processo contra Lula por crime de responsabilidade. “Os três se revelaram operadores do esquema. As denúncias são muito graves”, disse Paes de Barros. Cassação de Dirceu atinge o presidente LulaSe não for no coração ou na cabeça, órgãos vitais, Lula será atingido gravemente pela cassação do deputado José Dirceu: um ferimento não apenas doloroso, mas enfraquecedor e, talvez, comprometedor da sua mobilidade” - a análise, feita por um petista histórico, considera a importância política e as conseqüências para o Governo do processo, em fase terminal, do ex-chefe da Casa Civil.O placar na Comissão de Ética contra Dirceu - 13 x 1 - mostrou o grau de convicção da sua culpa por parte dos deputados e uma antecipação de que sua derrota no plenário deve superar a do ex-deputado Roberto Jefferson, seu acusador. Considerando as ligações históricas e afetivas de Dirceu com o presidente Lula, é significativo que a “base governista” na Câmara (que conseguiu eleger o deputado Aldo Rebelo para presidente da Casa) não tenha promovido qualquer ação, se não para salvá-lo, ao menos para protegê-lo de tão acachapante derrota. A informação de que José Dirceu cassado será melhor para a campanha de Lula, que o apresentará como mártir, do que na condição de resgatado das acusações, é risível. Esconde um fato: Lula não tem como salvá-lo.Campanha precipitadaUma semana depois de dizer que não sabia ainda se seria candidato à reeleição e que só queria tratar do assunto em março de 2006, Lula mudou de opinião: concordou com a proposta do novo presidente do PT em se declarar imediatamente candidato. Ricardo Berzoini (o ex-ministro da Previdência que perseguia com crueldade velhinhos aposentados) propôs a abertura precoce da campanha eleitoral como tática para levantar suspeição em relação a todas as denúncias de escândalos no Governo.“Quem falar mal do governo, acusar o PT, denunciar o governo - deve ser acusado de estar fazendo campanha contra Lula” - essa é a orientação que está sendo passada por Berzoini e pelo Palácio do Planalto.A antecipação da campanha eleitoral - contrariando a linha de propaganda do próprio Governo, surpreendeu senadores e deputados petistas - já foi assumida pelo próprio Lula no Rio na viagem em que abriu o congresso de agentes de viagem. O raciocínio vendido aos petistas é de que os nomes da oposição estão se cristalizando e que esse é o motivo da queda de Lula nas pesquisas. Tecnicamente, o gesto de desespero do presidente somente o enfraquece. Depois do mensalão, CPI descobre o semanãoLevantamento realizado pelo deputado Júlio Redecker (PSDB-RS) revelou, na CPI do Mensalão, que a periodicidade dos repasses de recursos do empresário Marcos Valério para financiar o esquema da compra de deputados da base governista foi semanal durante pelo menos 18 meses: de fevereiro de 2003 a agosto de 2004. “Os dados derrubam a tese do mensalão, que a partir de agora pode ser chamado de semanão”, afirmou o tucano.Durante acareação entre oito dos principais envolvidos no escândalo do mensalão, Redecker contestou a afirmação do presidente do PL, Valdemar da Costa Neto, de que não houve mensalão, porque não haveria periodicidade mensal nos repasses de recursos por Valério. No entanto, dados apresentados pelo tucano, com base na quebra de sigilo bancário da operadora Garanhuns, revelam que a empresa recebeu dinheiro da agência SMP&B por intermédio de cheques e transferências destinados a vários bancos em freqüência semanal. De acordo com o deputado, os valores somavam R$ 500 mil por semana nos primeiros meses, em 2003, e em 2004 passaram a R$ 300 mil semanais. “Para despistar, os depósitos eram feitos em valores diversos, mas que sempre somavam a mesma quantia semanal”, destacou. Redecker quer agora confrontar as informações com os nomes de todos os funcionários da Câmara para chegar à lista de todos os beneficiários do esquema do valerioduto.Partido PSol quer anulação de sessõesEnquanro a direita tenta minar o governo por um lado, a esquerda, comendada pelo P-Sol, conclama a população a considerar o grave problema embutido nas denúncias do mensalão para a compra de parlamentares do Congresso Nacional; alguns deles já claramente identificados. Diante da confissão de Delúbio Soares, quanto ao repasse de dinheiro aos partidos e parlamentares, somada à comprovação feita pelo COAF de que os saques nas contas de Marcos Valério ocorreram em datas próximas às votações de importantes medidas no Congresso Nacional, uma questão mais grave se apresenta. “Que legalidade pode ser reconhecida em leis encaminhadas e aprovadas por parlamentares que venderam seus votos?”, diz a senadora Heloísa Helena (AL). “O próprio relator da CPI já apontou o envolvimento de vários parlamentares, e sabemos também que não foram apenas os dezoito apontados, os abonados pelo valerioduto”, completa.Para Heloísa, o processo de desmantelamento do Estado brasileiro, e particularmente de sua Seguridade Social, foi concretizado por uma vantagem de apenas 40 votos dos deputados, e apenas 4 entre os senadores, o que traduz de forma definitiva a ilegitimidade desta e de outras votações ocorridas sob o signo do mensalão. Neste sentido, o PSol vem conversando com entidades sindicais dos servidores públicos e dos movimentos sociais em geral, assim como os demais partidos do campo progressista e democrático, para somar forças na construção de iniciativas políticas e judiciais com o objetivo de realizar uma grande campanha nacional pela anulação da legislação antipovo, aprovada com votos suspeitos de influência do mensalão.

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